Recentemente, algumas jurisprudências me deixaram muito revoltado, são elas duas do TJ-RS e uma do STJ, todas falando sobre relações sexuais entre adultos e menores de 14,idade para consentimento sexual em nosso diploma repressivo.
Em todas elas, não houve o entendimento pelos magistrados que houve o estupro presumido, como teoricamente mandaria a lei, vou passar caso a caso, do menos para o mais controverso(leia absurdo).
A primeira decisão,vinda do TJ-RS, entendeu que não houve estupro presumido no caso de um namoro entre um homem de 20 anos e uma menina de 12, porque eles possuíam uma relação estável, conhecida de todos e aprovada pelos pais da garota.Nesse caso, logo me veio a pergunta: o que diabos um cara de 20 quer com uma de 12?Objetivamente, só consegui pensar em disponibilidade sexual e submissão na relação, porque não consigo visualizar uma troca real de expectativas, desejos; até a pergunta como foi seu dia gera uma discrepância com uma na 6ª série e o outro trabalhando ou na faculdade.Essa eu nem achei tão absurda, é uma controvérsia válida de se analizar, porque não sei se esse homem também merece a pecha de estuprador.
A segunda,também das terras sulriograndenses(caiu o hífen né) ,decidiu por absolver um homem de 30 anos que mantinha relações sexuais com seus irmãos de 9,12 e 13 anos, por motivos hermenêuticos que não consegui encontrar,se baseando exclusivamente no fato dos 3 terem consentido.Só me pergunto uma coisa:Qual a dificuldade que um irmão tem para convencer o outro, 21 anos mais novo que aquilo é normal?Mesmo que não fossem menores de 14, na minha opinião ainda seria estupro,visto que o agente se aproveita de uma relação de confiança(fraternal) para satisfazer seus desejos sexuais.Essa decisão foi reformada pelo STJ, estando ele agora condenado pelo estupro.
Contudo,eis que o mesmo STJ,contrariando a jurisprudência acima, a absolver dois homens que contrataram os serviços de duas garotas de programa, uma de 12 e outra de 13 anos de idade, por considerar que, por não serem eles os iniciadores do abuso e exploração a que se submetem diariamente essas pobres meninas, não seriam imputáveis no crime, previsto no art.224-A do ECA, pela incrível alegação de que por já serem conhecidas meretrizes, não estariam mais sendo exploradas, como se a cada dia,a cada penetração de cada um dos doentes que contrataram seus serviços elas não fossem mais abusadas,pois mulheres de zona não são bem vistas pela sociedade. Resumindo,uma decisão que exala preconceitos.
Quero deixar claro que todos os incorrimentos abaixo derivaram das notícias,mas vieram de pensamento próprio e , por isso são apenas especulações de um estudante de direito que não viu nenhum dos três processos.
Eu vi um entrave jurídico pequeno nessa terceira questão, mas pelo que foi noticiado,a decisão estava proferida antes de se chegar à análise da lei.
Cheguei a conclusão que o magistrado poderia ter se visto em uma situação interpretativa do artigo e decidiu por não se aproximar de uma decisão que poderia ser vista como analogia em malam partem ,que é extender o que a lei penal elenca para atingir conduta não expressamente redigida.Todavia, não poderia concordar com essa decisão porque ele não estaria aumentando a extensão do crime e sim afirmando que esse tipo de conduta deveria ser enquadrado como abuso de menores.
Eu só me imagino quanto tempo é necessário viver na elitizada Brasília, a cidade onde não se vê pobreza(material),para se criar tanta pobreza de espírito, ao ponto de não conseguir ver um centímetro dentro da questão sociológica que envolve uma questão como exploração sexual de menores.Que se extendam as palavras do Ministro Joaquim Barbosa, originalmente endereçadas à Mendes, para esse Ilmo.Dr.Ministro do STJ.
Saia às ruas!
ps. nunca esqueçam de tentar ouvir as músicas dos títulos, elas geralmente represantam algo.
Capítulo 219 - Meu problema com a poesia
Há 4 anos
2 comentários:
O primeiro caso, apesar de me parecer no mínimo uma situação estranha, faz sentido já que a família da menor e a menor concordaram, e o rapaz não usou de violência para ela. E em alguns lugares tal atitude é inclusive socialmente aceita. Mas as outras duas são extremamente deploráveis e mais ainda as absolvições.
Com relação à decisão recente do STJ, que entendeu que "cliente" de adolescentes não podem ser classificados como exploradores sexuais, algumas pessoas defendem que o Ministério Público errou ao classificar o crime como exploração sexual, ao invés de estupro. Vamos analisar esta tese. Decisões do STF admitiam que o consentimento da vítima e a aparência de pessoa com mais idade poderiam afastar a presunção de violência do estupro, pois a presunção seria relativa e não absoluta. Daí porque o Ministério Público também corria risco de perder se alegasse estupro ao invés de exploração sexual. Além disso, o crime é específico, exploração sexual. A diferenciação entre o "cliente" (explorador) e o rufião (também explorador) é apenas na gradação da pena. O crime não é de estupro. Nem se diga que as penas são maiores para o estupro. Somente a pena miníma, que é de 4 anos, em oposição a pena mínima de 6 anos, do estupro. A pena máxima, em ambos os casos, é de 10 anos. O fato de haver este intervalo maior entre máxima é mínima é justamente para permitir diferenciar os graus de exploração. Assim, o entendimento de que "cliente" não é explorador é inadequado.
Por fim, em reforço à tese de que se trata de crime específico, de exploração sexual, deve-se esclarecer que é condição para o crime de estupro a conjunção carnal, o que não precisa acontecer para caracterizar exploração sexual. Assim, numa batida policial numa casa de prostituição, deveria ser responsabilizada a pessoa que estivesse com menor de idade, praticando ato libidinoso, mediante pagamento em dinheiro, sem necessidade de provar a efetiva relação sexual. Tal prova, da conjunção carnal, seria muito difícil de produzir quanto à pessoa que, tragicamente, é obrigada, de alguma maneira, a praticar várias relações sexuais seguidas. Assim, pretender acusar o "cliente" de estupro é caminho certo para manter a impunidade.
Essa argumentação (em torno da tese de estupro) também só seria aplicável às menores de 14 anos, mas a exploração sexual de adolescentes até 18 anos também é crime, de acordo com o ECA. E isso não tem nada a ver com o direito dos adolescentes maiores de 14 anos terem relacionamento afetivo, namorarem, estamos falando da exploração sexual COMERCIAL.
E o crime de "exploração sexual comercial de crianças e adolescentes", conceito legal recente (2000), é mais amplo que o de "rufianismo", que abrange apenas quem "tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça", figura do velho código penal. Se a intenção do legislador fosse punir apenas o cafetão, teria modificado este artigo, e não criado uma figura totalmente nova no ECA.
Divulgar que houve erro de enquadramento pelo Ministério Público é desinformar e favorecer a impunidade.
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